sexta-feira, janeiro 20, 2006

RECEIOS CRISTÃOS PERANTE A ASCENSÃO GENTIA NA UCRÂNIA

Imagem de uma festa pagã ucraniana


Há católicos preocupados com o Paganismo ucraniano. Neste caso concreto, mostram o seu temor galileu a propósito de um artigo de uma revista pagã ucraniana, a «Svarog» (Deus do Céu eslavo), voz da Associação dos crentes étnicos da Ucrânia, que dissemina a religião étnica deste país. Desse artigo, consta uma descrição de um concílio religioso pan-ucraniano realizado há poucos anos, na qual se pode ler o seguinte:
Condenamos a lei que considera o Cristianismo religião de Estado na Ucrânia... O Paganismo é um valor cultural de significado mundial. Hoje, a maior ameaça à vida das nações é a globalização económica e religiosa. A citada publicação pagã afirma também que, para obter o controle global, a globalização precisa de criar um conglomerado cosmopolítico sem nações.

Perante esta denúncia do papel que o Cristianismo e afins têm andado a desempenhar ao longo de mais de um milénio, o autor da crítica católica vai de tentar o velho truque cristão - começa por dizer, com aspecto de objectividade, que os intuitos destes novos pagãos não são realmente religiosos mas sim políticos, inscrevendo-se no âmbito do Nacionalismo, isto é, do etnicismo e da consciência racial; a pouco e pouco, contudo, a verve da intolerância doutrinal acaba por vir ao de cima, sendo assim mais forte do que qualquer aparência de objectividade analítica que sirva para esconder a real intenção de alguns dos mais militantes arautos do Crucificado - a destruição das outras religiões e a imposição do Deus dos sem raça revelado apenas por meio dos Judeus.

Assim, para declarar como meramente político o verdadeiro intuito dos pagãos ucranianos, e de outros crentes étnicos das ex-repúblicas soviéticas, o autor do artigo cristão cita esta afirmação lida na revista pagã:
«É necessária uma nova ideologia de Direita radical... uma lei radicalmente nacional, uma lei que reconheça a prioridade da religião nacional, uma lei que proíba o Judaísmo e o Sionismo como ideologia. O politeísmo ariano e o monoteísmo semítico são concepções opostas do mundo.»

E é a partir daí que o escriba de Cristo resolve tecer os seus comentários subtilmente depreciativos, querendo colar o Paganismo ao Panteísmo e aproveitando a deixa para dizer que os Deuses pagãos não têm personalidade definida, e que fica tudo confuso no seio da natureza, num estilo, diz o escriba, «globalizado», mas, diz ele, prefere não aplicar esse termo para não ofender os neo-pagãos...

E, no fim, manifesta o seu receio de que as massas possam aderir ao «romantismo nacionalista» destes modernos herdeiros dos Deuses étnicos.

E talvez não seja infundado esse receio - efectivamente, nada há de mais natural, em termos religiosos, do que a relação pagã entre as Divindades e as pessoas, que é, como reconhece o católico italiano, não uma subordinação do indivíduo a Deus, mas sim uma ligação em tudo similar aos laços que unem os homens aos seus ancestrais.

16 Comments:

Anonymous Anónimo said...

" a imposição do Deus dos sem raça"

O que é que os deuses têm a ver com a raça de cada um? Estás a dizer que os deuses são racistas? Quero dizer, racialistas?

21 de janeiro de 2006 às 00:39:00 WET  
Blogger Caturo said...

Quer dizer que cada «raça», isto é, cada povo, cada estirpe, tem os seus Deuses. Só o Deus universalista é que pretende eliminar os outros Deuses e impor-se como único a todos os povos por igual.

21 de janeiro de 2006 às 01:12:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

"Quer dizer que cada «raça», isto é, cada povo, cada estirpe, tem os seus Deuses"

Uhm. Mas com certeza que não estás a por os teus deuses pagãos no mesmo nível que o deus cristão, este omnipotente e criador de todos os seres vivos - sendo assim, um deus universal, Pai de todos os homens - e neste prima, a raça não interessa, porque é uma criação divina.

Mas os teus deuses são étnicos, quase humanos. Não sou cristão, mas percebo porque é que o deus cristão é universal, e os teus deuses não o são.

21 de janeiro de 2006 às 01:43:00 WET  
Blogger Caturo said...

Mas com certeza que não estás a por os teus deuses pagãos no mesmo nível que o deus cristão,

Claro que estou. Abaixo é que não.



este omnipotente e criador de todos os seres vivos - sendo assim, um deus universal, Pai de todos os homens - e neste prima, a raça não interessa,

Interessa sim, porque não tenho de concordar que esse Deus judaico criou todas as raças.



Mas os teus deuses são étnicos, quase humanos.

Falta o quase.



Não sou cristão, mas percebo porque é que o deus cristão é universal, e os teus deuses não o são.

Evidentemente. Os Deuses pagãos não são universalistas. A tara venenosa do universalismo religioso foi trazida à Europa pelo Cristianismo. É aí que está a raiz dos maiores males do homem branco.

21 de janeiro de 2006 às 14:15:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

Quem é que criou o universo, o mundo, os animais, o homem e toda a sua diversidade? Não me digas que os deuses pagãos só criaram o homem branco....

21 de janeiro de 2006 às 23:04:00 WET  
Blogger Caturo said...

Quem é que criou o universo, o mundo, os animais, o homem e toda a sua diversidade?

Não sei.

Não podem ter sido vários Deuses? Porque é que tem de haver apenas um grande «criador» ou «formador» de toda essa diversidade? O politeísmo espelha precisamente isto - a diversidade.

22 de janeiro de 2006 às 18:07:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

" Não podem ter sido vários Deuses? "

Boa questão!

22 de janeiro de 2006 às 18:39:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

Estou a perceber... Com que então o ideal de uma festa pagã é um bando de gajas a meter-se nuas na água. Aposto que nenhum dos "pagãos homens" ucranianos fez algo do género, que isto de pôr mulheres nuas prai é que está a dar.

23 de janeiro de 2006 às 15:18:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

haha excelente imagem, assim até da gosto ir a festas pagas. Muito bom

23 de janeiro de 2006 às 15:48:00 WET  
Blogger Sefodeu said...

1 - Quanto ao 'post' há que admitir... às ucranianas tudo se perdoa. Olhai e vede como estao alegres e pimponas!

2 - Falando a sério, nao me escandaliza nada que haja esse tipo de festas. Contudo, parece-me que se reduzem a uma versao popularucha e um quanto reduzida do paganismo. Falta o sagrado, este nao se evoca bebendo uns copos, mandando umas postas de pescada e mandando uma queca na ucraniana que emborcou mais bagaço (para eles deve ser Vodka ou assim). O paganismo sem se inserir num conceito chamado - TRADIÇÃO - simplesmente é tão humano (e profano) como o Declaraçao dos Direitos do Homem(essa liçaozeca do grau maçom de aprendiz; qualquer alto grau nao vai nessa conversa).

3 - Isso dos deuses serem nacionais tem algo de verdade mas tb nao é bem, bem assim... O que realmente é puramente nacional ou étnico são 2 coisas:
a) a relaçao entre alguns deuses particulares e os cultos mais valorizados por um determinado povo.
b) o acesso que um indivíduo tem ao sagrado segundo a sua ascendência ou casta. Por exemplo, o acesso do Judeu à Kabalah é maior que o de um Ariano. O oposto de verifica se houver uma leitura do Bhagavad Gita.
De resto, a estrutura do mundo pagão é até bastante universal

Forma:

(Masculinidade)- Pai-Céu/Sol/Urano
(Feminilidade)- Mae-Terra(Tellus Mater)/Lua
(Androgenia; nunca pura mas oscilante)-Mar/Eter/Pneuma(Espírito)/Demiurgo

Temporalidade:

(Ciclo ou Eterno-Retorno); fases: 1 - Nascimento - O Céu Fecunda a Terra (chuva divina, um culto universalíssimo). A masculinidade quer individuar a matéria (feminina) que está em potência. Ela, a terra, colabora como mãe.
2 - Manutenção (Fase média) - os símbolos e as relaçoes misturam-se, por vezes invertem-se. Por exemplo, O Indivíduo(Heroi, por exemplo) é levado pelo fogo da fortuna (neste caso habitualmente feminina, como o fogo do vulcao - e note-se que o fogo é habitualmente um elemento masculino/solar).
3 - Paixão e Morte ou via da morte - A deusa já não como mãe, isto é, como colaboradora do trabalho do sol, mas como amante. Como amante ela procura e profuca a fusao e o regresso à terra.

Claro está, isto depois pode ser trágico, heroico, etc... até cómico. Contudo esta estrutura está em toda a parte. Os deuses variam? Só de nome, praticamente. A sua funçao é traduzível de cultura para cultura.

Existe uma faceta Nacional do paganismo, e forte. Mas o que varia nao sao, nem os deuses, nem a sua funçao; mas sobretudo o tipo de relaçao que o ser humano estabelece como eles (isto é, que casta tem mais acesso a que religiosidade e à 'bençao' de que deus, que tipo de deus acaba por ser mais importante nesta determinada Naçao, etc... etc...)

Eu dei-te sempre uma certa razao quanto à oposiçao entre universalismo/nacionalismo, pois ela existe, mas vamos lá ver que tipo de universalismo ou que tipo de nacionalismo estamos a falar.

1 abr,

Isento

23 de janeiro de 2006 às 17:52:00 WET  
Blogger Caturo said...

2 - Falando a sério, nao me escandaliza nada que haja esse tipo de festas. Contudo, parece-me que se reduzem a uma versao popularucha e um quanto reduzida do paganismo

Com que base é que dizes isso? Já assististe a alguma?



Falta o sagrado, este nao se evoca bebendo uns copos, mandando umas postas de pescada e mandando uma queca na ucraniana que emborcou mais bagaço (para eles deve ser Vodka ou assim).

Também se evoca bebendo uns copos, mandando umas postas de pescada e envolvendo-se em feliz rebaldaria com belas jovens de leste, e o bagaço, ou o vodka, ajudam a quem deles gostar.



O paganismo sem se inserir num conceito chamado - TRADIÇÃO -

Falta explicar em concreto o que quer isso dizer neste caso específico.



3 - Isso dos deuses serem nacionais tem algo de verdade mas tb nao é bem, bem assim... O que realmente é puramente nacional ou étnico são 2 coisas:
a) a relaçao entre alguns deuses particulares e os cultos mais valorizados por um determinado povo.
b) o acesso que um indivíduo tem ao sagrado segundo a sua ascendência ou casta. Por exemplo, o acesso do Judeu à Kabalah é maior que o de um Ariano. O oposto de verifica se houver uma leitura do Bhagavad Gita.
De resto, a estrutura do mundo pagão é até bastante universal

Forma:

(Masculinidade)- Pai-Céu/Sol/Urano
(Feminilidade)- Mae-Terra(Tellus Mater)/Lua
(Androgenia; nunca pura mas oscilante)-Mar/Eter/Pneuma(Espírito)/Demiurgo


Androginia? É muito pouco importante nos panteões pagãos europeus. Aliás, só conheço referências a tal coisa na Grécia. Mas mesmo aí não há nenhuma Divindade importante que seja andrógina, excepto Dionisos, mas que raramente é assim encarado.



Temporalidade:

(Ciclo ou Eterno-Retorno); fases: 1 - Nascimento - O Céu Fecunda a Terra (chuva divina, um culto universalíssimo).


Nem sempre. Tanto quanto sei, tal ideia não existe por exemplo na cosmogonia nórdica.

Quanto à Mãe, é quase sempre a Terra, mas no Egipto, por exemplo, a terra é masculina e o céu é que é feminino.

e note-se que o fogo é habitualmente um elemento masculino/solar).

Mas atenção ao Fogo Sagrado do Lar e da Pátria que na Grécia e em Roma é mantido pelas Deusas Héstia e por Vesta respectivamente.



Os deuses variam? Só de nome, praticamente.

E não só. Nalguns casos, é verdade, mas noutros, nem por isso, o que traz autênticos quebra-cabeças para os estudiosos dos panteões menos bem conhecidos quando tentam compreender arcaicos Deuses por comparação com Divindades supostamente equivalentes de culturas mais bem conhecidas.

Na Gália, por exemplo, Júlio César descreveu a religião gaulesa como estando centrada em cinco grandes Divindades. Os nomes que César chamou a tais Entidades, foram nomes romanos. Chama-se a isto «interpretatio romana», processo muito utilizado por Romanos, e também por Gregos, quando queriam descrever as religiões dos outros povos. Consiste em estabelecer equivalências entre os Deuses com base nas suas funções. Por exemplo, se os Romanos deparavam com um povo bárbaro que, antes da batalha, louvava Deus X (Cujo nome indígena era muitas vezes impronunciável para as delicadas bocas clássicas), o observador romano dizia «Olha, os bárbaros estão a louvar Marte».

E porque é que o romano diz isto?

Porque Marte é o Deus da Guerra e o romano pensou que os bárbaros estivessem naquele caso a louvar o seu Deus da Guerra.

É neste contexto que por exemplo o helénico Estrabão afirma que os Lusitanos prestam culto a Ares, porque Ares é o Deus da Guerra helénico.

Voltemos a César. Disse ele que as principais Divindades gaulesas eram Mercúrio, Júpiter, Minerva, Marte e Apolo.

Ora, como é bom de ver, estes nomes não são gauleses e sim greco-romanos (Apolo é grego, os Outros são romanos).
Os nomes gauleses eram outros.

E aqui é que a porca torce o rabo, porque os especialistas do assunto vêem-se em palpos de aranha para estabelecer equivalências entre os Deuses clássicos e os nomes dos Deuses gauleses que são hoje conhecidos por meio da epigrafia (inscrições romanas em pedra) e uma ou outra fonte literária (Lucano, diferentemente dos outros autores mediterrânicos, mencionou teónimos gauleses).

Têm-se obtido sucessos no estabelecimento destas equivalências, sem que o panorama geral deixe contudo de ser um tanto ou quanto nebuloso. Efectivamente, mesmo nos casos de maior clareza, há uma manifesta desigualdade de panteões. Por exemplo, César (em «A Guerra das Gálias» ou «De Bello Gallico») afirmou que o Deus mais adorado pelos Gauleses era Mercúrio. Hoje, sabe-se, ou pensa-se, que este Mercúrio gaulês se chamava Lug, também chamado Lugus e, na Irlanda, Lugh, ao passo que em Gales é Llew e, na Celtibéria, Lugoubes.
Tal como Mercúrio, Lug é um Deus das viagens, dos caminhos, do comércio também.
Mas não é só isso – é também Deus de todas as artes (é historiador, poeta, mago, ferreiro, entre outras coisas) e também um Deus fortemente bélico. O Seu objecto sagrado é ou uma lança ou uma funda, ou ambos. Além disso, também tem uma função de soberania, porque chegou a ser rei dos Deuses (pelo menos na Irlanda). Sendo assim, não é exactamente igual a Mercúrio. É por exemplo muito semelhante ao germânico Wotan, Woden ou Odin, O Qual foi também considerado equivalente a Mercúrio porque, tal como este, é também um psicopompo, ou seja, condutor das almas para o Outro Mundo, mesmo que, no essencial, Odin seja o Deus da Sabedoria, das Batalhas e da morte em combate. Mas não é o Deus da Guerra germânico (isto é um encadear quase interminável), função que é preenchida por outros Deuses, tais como Thor e Tyr.

Quando os Romanos entraram em contacto com os Germanos, tentaram compreender os seus Deuses através do supracitado processo da interpretatio romana. Ora, como os Germanos tinham uma assembleia de homens livres que compareciam armados na reunião, e como aprovavam as resoluções batendo nos escudos, o observador romano (neste caso, Tácito em «A Germânia») concluiu que o Deus que presidia ao evento era o Deus da Guerra dos Germanos e, por isso, chamou-Lhe Marte. Mas o Seu nome germânico é Ziu, Tiuz ou Tyr (sim, é a mesma palavra mas com pronúncia diferente consoante as regiões), que, etimologicamente, é parecido com Zeus e com Júpiter, mas não com Marte.
E porquê?
Porque, tal como Zeus e Júpiter, Tyr é antes de mais nada um Deus do Céu (do Indo-Europeu *Dieus, derivado do radical indo-europeu *Dei-, que significa algo como «brilho celeste», o que significa que o grande Deus Indo-Europeu é em primeiro lugar uma Entidade do céu luminoso) e, tal como os dois Deuses clássicos, também é Jurista.
Mas, como a cultura germânica é especialmente belicista, os principais Deuses germânicos têm todos um marcado aspecto marcial. Por isso, Tyr é também um Deus da Guerra. Tanto os Romanos como os Germanos ficaram pois convencidos de que Tyr e Marte eram equivalentes, por isso é que, quando os Germanos adoptaram a semana romana de sete dias, chamaram «Dia de Tyr» (Dienstag em Alemão, Tuesday em Inglês, Tirsdag em Dinamarquês) à terça-feira, dado que, na língua dos Romanos, o dia é consagrado a Marte (Dies Martis, daí o Martes Castelhano e o Martedi italiano, por exemplo).

Nessa mesma altura, ambos os lados acharam que o equivalente germânico de Júpiter era Thor, porque são ambos Deuses do Trovão e do Céu, mas Thor é igualmente o grande guerreiro da tradição germânica (quase igual ao indiano Indra), o mais forte dos Deuses, Aquele que tem a arma mais poderosa (o martelo Mjollnir), embora não seja o mais sábio, daí que não seja, quase nunca, o rei dos Deuses, que é Odin. Thor é, na função social, equivalente a Marte, Deus da Guerra, e, no estilo, muito similar ao greco-romano Hércules.
Por isso, a quinta-feira chama-se Dies Iovis em Latim (Dia de Júpiter), mas o seu nome nas línguas germânicas é «Dia de Thor»(Donnerstag em Alemão, Thursday em Inglês, Torsdag em Sueco).
A quarta-feira é por seu turno «Dies Mercuris» em Latim e «Dia de Odin» nas línguas germânicas (Wednesday em Inglês, Onsdag em Dinamarquês). Recomendo a este propósito esta magnífica página:

http://en.wikipedia.org/wiki/Days_of_the_week

Estes são apenas alguns dos exemplos que mostram que as equivalências entre os Deuses de diferentes povos não são sempre nítidas e exactas.

Saudações Nacionais

24 de janeiro de 2006 às 15:27:00 WET  
Blogger Sefodeu said...

1 - Caturo:
Com que base é que dizes isso? Já assististe a alguma(Festa Pagã)?

Resposta:
Conheço um pouco o ambiente, sim. Reparei que não anda muito longe de um misto entre o êxtase dionisíaco e das antigas orgias; contudo, na sua versão moderna. Este tipo de manifestaçao tem dois níveis e um é superior ao outro:

a)Nível Social (psico-sociológico, pouco interessante) - Fazer desaparecer o tabu e a pressão do pudor; a origem destes elementos está quase sempre na relaçao do indivíduo consigo mesmo, ainda que por razoes variáveis (obscurecer o que nos torna semelhantes aos animais e que podia ser visto como embaraçante, não perder a posse de si mesmo, etc...). Desde sempre que se marcaram festas em que todos fazem o mesmo, desaparecendo assim a relaçao indivíduo/norma. Trata-se de uma espécie de alivio global, ou compensaçao.

b) Nível Passional-Religioso (um pouco mais interessante) - Festa orgíaca que procura o desaparecimento do indivíduo no acto sexual massificado. Trata-se de uma procura da Eterna-Paixão ou Eterna-Passividade, quase mística, no amor e na morte.

Tudo isto sempre houve, porém, tenho a dizer 2 coisas:

a) O que vi até agora pareceu-me demasiado moderno e nao muito diferente dos festivais tipo Sudoeste (quem vai ao sudoeste pretende exactamente o mesmo só que nao fala de deuses e deusas, nao é a sua onda, nao acham isso ... fixe)

b) Ainda que sejam manifestações relativamente religiosas são tentativas externas de transcendência; sem iniciação não existe sagrado propriamente dito.

Com isto nao estou contra que a malta se divirta, mas isso passa com a idade.

2) Tradição - Conjunto de Hábitos, Ritos e Ensinamentos provinientes da Comunhão Originária entre o Homem e a Divindade. (nao implica necessariamente que quanto mais antigo mais sagrado, porém, quanto mais originário mais sagrado - claro. Até o Catecismo da Igreja Católica sustenta a memória dessa convivencia, inserindo a própria doutrina numa vertente dessa tradiçao e o restante - ordens, cultos, etc... - de carácter necessariamente iniciático, como consequências de um estado originário perfeito. Essa é a razão pela qual se fala no bom paganismo como uma Religião do Espírito Santo)

3 - Adrogenia:

Ao contrário do que as correntes modernas sugerem, por serem limitadas ao biológico e psicológico (e pela sempre injustificada mania de tentar entender o espírito pelo corpo e nao o corpo pelo espírito), a Androgenia em si não existe, nem no ocidente, nem no oriente. Tens deuses sem sexo? materialmente sim. Contudo, isso acontece pois a sua sexualidade muda conforme o seu papel no quadro simbólico em que se inserem. Shiva, por exemplo, tem um papel feminino quando se encontra em referencia a Brahma; mas torna-se masculin@ noutros contextos. NUNCA existe o masculino/feminino sob um só plano e momento de consideraçao. Toda esta coisa Transexual nao tem absolutamente ponta por onde se lhe pegue e muito menos uma razao espiritual segundo a tradiçao (só na cabeça limitada de um modernaço é que isso pode fazer sentido).
Referi-me a androgenia por causa daquele estado intermédio entre a afirmaçao e a morte pelo qual todo on ente passa; por exemplo, na mundividencia cristã, o Espírito Santo tem por vezes papeis masculinos, por vezes femininos; pois o Seu carácter varia segundo a epifania em causa.

É possível que tenhas razao sobre estas epifanias de sexualidade variavel estarem menos presentes na espiritualidade nórdica. Sei pouco sobre essa espiritualidade, pelo qual gostaria que me aconselhasses bibliograficamente.

4 - Caturo:

"Tanto quanto sei, tal ideia não existe por exemplo na cosmogonia nórdica."

R - A Terra ama a chuva e deseja-a,
...
e o Céu majestoso, por sua vez,
gosta de voltar a cair sobre a
terra
...
Entao, quando ambos se unem no
amplexo amoroso
Fazem crescer e engrandecer
tudo aquilo
que faz viver e prosperar a
linhagem dos homens

Eurípedes (frg 898.8 Nuack)

Esta relaçao é universal, nao só na sua forma primitiva (tribos australianas, polinésias, africanas etc) mas tb, na Grega e Oriental. As religioes nacionais nórdicas provéem de migraçoes eurásicas; de certeza que têm isto (mais ou menos explicitamente). Mas, é uma questao de eu informar-me e depois dar-te uma passagem (tenho realmente pena de conhecer tao pouco as hierofanias nórdicas)
mas este tipo de estruturas estao em todo o lado.

5 - Caturo:

"Mas atenção ao Fogo Sagrado do Lar e da Pátria que na Grécia e em Roma é mantido pelas Deusas Héstia e por Vesta respectivamente."

R: Acertaste em cheio, estava a pensar precisamente no fogo romano qd escrevi essa passagem.

6 - Quanto às equivalencias e traduçoes de deuses. Referia-me a estruturas do sagrado; sou o primeiro a admitir que as manifestaçoes divinas tem particularidades segundo cada povo. Também me parece verdade o que disseste; trata-se de um trabalho difícil e muitas vezes falta nitidez. Contudo, levar esse trabalho a cabo nao deixa de ser fascinante para quem se interessa por espiritualidade e estruturas do pensamento religioso.

1 abr.

Isento

(ah, nao te esqueças, vê se sabes de um bom livro sobre religioes nórdicas, infelizmente conheço-as pouco)

24 de janeiro de 2006 às 18:11:00 WET  
Anonymous Anónimo said...

Ei Caturo mete mais fotos destas aqui no blog! O pessol gosta e agradece! E com identitarias deste calibre sempre se consegue atrair mais pessoal!

25 de janeiro de 2006 às 13:39:00 WET  
Blogger Caturo said...

Com que base é que dizes isso? Já assististe a alguma(Festa Pagã)?

Conheço um pouco o ambiente, sim. Reparei que não anda muito longe de um misto entre o êxtase dionisíaco

Caro Isento, quem assiste a uma não assiste a todas.
A pergunta que fiz foi: assististe a alguma celebração pagã eslava feita por pagãos nacionalistas?



b) Nível Passional-Religioso (um pouco mais interessante) - Festa orgíaca que procura o desaparecimento do indivíduo no acto sexual massificado.

Tanto quanto sei, isso nada tem a ver com os rituais indo-europeus.



b) Ainda que sejam manifestações relativamente religiosas são tentativas externas de transcendência;

Externas como? O que esperavas?


sem iniciação não existe sagrado propriamente dito.

Quem o disse? Que iniciação tiveram os povos das antigas tribos europeias? Ou de Roma? Ou da Grécia?

Entretanto, que iniciação tiveram os primeiros cristãos? Que iniciação têm os modernos cristãos?



2) Tradição - Conjunto de Hábitos, Ritos e Ensinamentos provenientes da Comunhão Originária entre o Homem e a Divindade.

Deixemos que sejan as Divindades a escolher se os ritos que agora Lhes são dedicados podem por Elas ser aceites ou não.;)



(nao implica necessariamente que quanto mais antigo mais sagrado, porém, quanto mais originário mais sagrado

Em assim sendo, isso quer dizer que realizar um ritual romano bem conhecido (descrito por Catão) é mais sagrado do que realizar um ritual cristão?




Shiva, por exemplo, tem um papel feminino quando se encontra em referencia a Brahma; mas torna-se masculin@ noutros contextos.

Podes-me indicar alguma obra na qual eu leia algo sobre isso?



É possível que tenhas razao sobre estas epifanias de sexualidade variavel estarem menos presentes na espiritualidade nórdica.

Na romana creio que também não existe.



Sei pouco sobre essa espiritualidade, pelo qual gostaria que me aconselhasses bibliograficamente.

História da Europa Pagã, por Nigel Penick e Prudence Jones, é um bom começo, para te situares; também é útil a «Mitologia» (um dos seis volumes) de Maria Lamas; há ainda a «Mitologia dos Povos Germânicos», de Maria Lucília Ferreira (ou Pereira), mas atenção que há aí uma série de coisas que não têm a ver com a mitologia nórdica propriamente dita e sim com fábulas posteriores.

É chato, mas o essencial do que tem de ser recomendado ainda não existe em Português: a Edda Poética e a Edda em prosa (em prosa é mais sintética e sólida para os que começam agora a ler sobre o assunto).



4 - Caturo:

"Tanto quanto sei, tal ideia não existe por exemplo na cosmogonia nórdica."

R - A Terra ama a chuva e deseja-a,


Sim, a chuva a fertilizar a terra existe, claro. Mas não como cosmogonia, era a isto que me referia.


Saudações Nacionais

25 de janeiro de 2006 às 15:20:00 WET  
Blogger Sefodeu said...

1)

Caturo:
A pergunta que fiz foi: assististe a alguma celebração pagã eslava feita por pagãos nacionalistas?

Resposta:
Nao.

Nível Passional-Religioso (um pouco mais interessante) - Festa orgíaca que procura o desaparecimento do indivíduo no acto sexual massificado.

2)
Caturo:
Tanto quanto sei, isso nada tem a ver com os rituais indo-europeus.

Resposta:
Orgia vem do termo 'werg' (fazer) que, como é óbvio depois resulta em palavras como work - trabalhar. O termo é indo-europeu. Os ritos relacionados com a orgia encontram-se mais facilmente na Grécia e em Roma, mas estes de algum lado vieram - na Índia há muito existiam. Contudo, este fenómeno como rito sempre se encontrou por todo o lado (na wikkipedia podes ver a relaçao que se estabelece entre a festa de Yule e ritos orgiacos; http://pt.wikipedia.org/wiki/Yule. Este é um exemplo entre muitos)

O que eu me estava a referir era ao próprio conceito de orgia (nao necessariamente gregos nem romanos); na Índia já praticava a orgia como diluiçao, como via da mao esquerda. Orgia é sempre diluiçao de eu, por isso é que tem um determinado tipo de caracter sagrado. Isto é, do tipo feminino. Falo em termos estruturais, claro. A orgia nao procura a afirmaçao da individualidade mas o regresso à morte (livros relacionados: amor no ocidente, Dennis de Rougement; Metafísica do Amor, Schopenhauer; Metafísica do Sexo, Julius Evola).

A minha crítica, que nao era propriamente uma crítica, concerne o nível de espiritualidade em causa da festa paga a que te referiste. Mas, nao sei, se calhar até pode ser algo mais exigente do que estou neste momento a pensar.

3)

sem iniciação não existe sagrado propriamente dito.

Caturo:Quem o disse? Que iniciação tiveram os povos das antigas tribos europeias? Ou de Roma? Ou da Grécia?

Resposta: quem é que te disse que a iniciaçao era para o povo?

Caturo:Entretanto, que iniciação tiveram os primeiros cristãos? Que iniciação têm os modernos cristãos?

Resposta: O baptismo, lá está. Iniciaçao para todos?... só mesmo no cristianismo. Fora do cristianismo os povos têm experiências de transcendência, de relaçao participativa com o sagrado, contudo, sao profanos. Só os iniciados 'iniciam' um caminho verdadeiramente sagrado.
(nao falo só no oriente, no mundo helénico e latino, e nas ordens ocidentais, mas em todas as religioes nao cristas existe uma separaçao bem clara entre quem mexe directamente no sagrado e quem simplesmente participa.)
A Iniciaçao é a linha que limita o Sagrado do Profano (ver: Eliade)

4)

Caturo: Deixemos que sejan as Divindades a escolher se os ritos que agora Lhes são dedicados podem por Elas ser aceites ou não.;)

Resposta: nao emendo uma letra da tua frase.

Caturo: Em assim sendo, isso quer dizer que realizar um ritual romano bem conhecido (descrito por Catão) é mais sagrado do que realizar um ritual cristão?

Resposta: para um cristao 'originário' significa estar o mais directamente e mais profundamente enraizado em Cristo. Isso varia de segundo em segundo. Fidelidade à consciencia e à direcçao espiritual (que sao uma só coisa).

Quanto a ritos litúrgicos, nao escondo o meu particular gosto pelo rito de S.Pio V.

5)

Shiva, por exemplo, tem um papel feminino quando se encontra em referencia a Brahma; mas torna-se masculin@ noutros contextos.

Podes-me indicar alguma obra na qual eu leia algo sobre isso?

Resposta: Até agora, o melhor que encontrei sobre as relaçoes entre o masculino e o feminino, onde tudo isso é descrito, foi a Metafísica do Sexo do J. Evola.

1 abr,

Isento
(vou ver se encontro os livros q me aconselhaste)

30 de janeiro de 2006 às 18:33:00 WET  
Blogger Caturo said...

A pergunta que fiz foi: assististe a alguma celebração pagã eslava feita por pagãos nacionalistas?

Nao.


Nível Passional-Religioso (um pouco mais interessante) - Festa orgíaca que procura o desaparecimento do indivíduo no acto sexual massificado.

Essa do desaparecimento do indivíduo é apenas uma interpretação como outra qualquer. Mas não creio que os eslavos que entram em tais festas tenham o intuito de desaparecer como indivíduos, mas sim libertarem-se e viverem à grande, ao máximo, intensamente.



Tanto quanto sei, isso nada tem a ver com os rituais indo-europeus.


Orgia vem do termo 'werg' (fazer) que, como é óbvio depois resulta em palavras como work - trabalhar. O termo é indo-europeu. Os ritos relacionados com a orgia encontram-se mais facilmente na Grécia e em Roma, mas estes de algum lado vieram - na Índia há muito existiam. Contudo, este fenómeno como rito sempre se encontrou por todo o lado (na wikkipedia podes ver a relaçao que se estabelece entre a festa de Yule e ritos orgiacos; http://pt.wikipedia.org/wiki/Yule. Este é um exemplo entre muitos)

O que eu me estava a referir era ao próprio conceito de orgia (nao necessariamente gregos nem romanos); na Índia já praticava a orgia como diluiçao, como via da mao esquerda. Orgia é sempre diluiçao de eu, por isso é que tem um determinado tipo de caracter sagrado. Isto é, do tipo feminino. Falo em termos estruturais, claro. A orgia nao procura a afirmaçao da individualidade mas o regresso à morte (livros relacionados: amor no ocidente, Dennis de Rougement; Metafísica do Amor, Schopenhauer; Metafísica do Sexo, Julius Evola).


Alto... eu não disse que não havia orgias na tradição indo-europeia, o que eu disse é que a interpretação que dela apresentas nada parece ter a ver com a espiritualidade indo-europeia, que nunca foi amiga da dissolução na massa.




sem iniciação não existe sagrado propriamente dito.

Caturo:Quem o disse? Que iniciação tiveram os povos das antigas tribos europeias? Ou de Roma? Ou da Grécia?

quem é que te disse que a iniciaçao era para o povo?

Mais me ajudas. Portanto, se estamos a falar do povo, e o povo também participa no sagrado, para que é a iniciação?



Entretanto, que iniciação tiveram os primeiros cristãos? Que iniciação têm os modernos cristãos?

O baptismo, lá está.

Crês que passar água pelo corpo transforma o entendimento?

Nesse caso, em que é que isso supera o erguer dos braços ao céu, em homenagem aos Deuses da estirpe?


Fora do cristianismo os povos têm experiências de transcendência, de relaçao participativa com o sagrado, contudo, sao profanos. Só os iniciados 'iniciam' um caminho verdadeiramente sagrado.

Discordo. Não há nada que prove que os iniciados de Elêusis estavam num caminho mais sagrado do que os devotos de Júpiter. A matéria relativa às iniciações parece ter uma origem mediterrânica, em contraste com a religiosidade dos indo-europeus, que era aberta e límpida, sem secretismos.



(nao falo só no oriente, no mundo helénico e latino, e nas ordens ocidentais, mas em todas as religioes nao cristas existe uma separaçao bem clara entre quem mexe directamente no sagrado e quem simplesmente participa.)

E como sabes que os actuais sacerdotes eslavos não têm um contacto vivo com o sagrado, diferentemente dos que simplesmente participam nos rituais?



Deixemos que sejam as Divindades a escolher se os ritos que agora Lhes são dedicados podem por Elas ser aceites ou não.;)

nao emendo uma letra da tua frase.


Em assim sendo, isso quer dizer que realizar um ritual romano bem conhecido (descrito por Catão) é mais sagrado do que realizar um ritual cristão?

para um cristao 'originário' significa estar o mais directamente e mais profundamente enraizado em Cristo.

Do mesmo modo, para um pagão o «originário» significa estar o mais directa e profundamente ligado aos Deuses pagãos, por rituais antigos ou modernos.



Shiva, por exemplo, tem um papel feminino quando se encontra em referencia a Brahma; mas torna-se masculin@ noutros contextos.

Podes-me indicar alguma obra na qual eu leia algo sobre isso?

Até agora, o melhor que encontrei sobre as relaçoes entre o masculino e o feminino, onde tudo isso é descrito, foi a Metafísica do Sexo do J. Evola.

Também li esse magnífico livro, mas atenção que o Evola não era um hindu.


Saudações Nacionais

1 de fevereiro de 2006 às 12:20:00 WET  

Enviar um comentário

<< Home