“Será que temos realmente vontade de combater”?
 Tais (ou aproximadamente tais) frases enchem hoje os média americanos que escrevem sobre a Síria. A necessidade da guerra põe-se em dúvida por várias causas: desde a falta de certeza de que as informações sobre a utilização de armas químicas pelas tropas de Bashar Assar sejam autênticas, até argumentos económicos. Contudo, o factor de presença da Marinha da Rússia na região ocupa na motivação um lugar substancial. Os americanos reflectem sobre as consequências do casual impacto de um míssil de cruzeiro da Força Naval dos EUA numa nave russa. Peritos pensam mais noutras coisas: os radares de navios russos são capazes de “cobrir” plenamente o espaço aéreo da região do Mediterrâneo. Levando em consideração a situação corrente, não há quaisquer garantias de que a informação detectada por estes radares não seja transmitida imediatamente a Damasco, o que aumentará bruscamente as possibilidades e a eficácia da Defesa Anti-aérea e Costeira da Síria.
 “Será que temos realmente uma vontade de combater pela Al-Qaeda”?
 Esta é mais uma pergunta que fazem muitos americanos e aqui devemos destacar especialmente o papel dos média russos, inclusive do canal televisivo Russia Today. A apresentação activa de um ponto de vista alternativo, entrevistas sobre a imagem real e a composição dos adversários do regime de Assad em combinação com alta qualidade da transmissão e bons apresentadores conseguiram reverter a opinião quase formada sobre os integrantes da oposição síria como “lutadores pela liberdade”. “Será que de facto estão apoiando as pessoas, cujos comandantes podem comer o coração de um inimigo no campo de combate?”. A semelhante pressão no povo americano conhecido pelo sentido de justiça e a compreensão das normas éticas não pôde passar sem deixar sinal – hoje, uma esmagadora parte da população dos EUA manifesta-se contra a guerra ou, no mínimo, duvida da sua racionalidade. Nestas condições, a transferência da iniciativa ao Congresso testemunha, ao que tudo indica, a aspiração de Obama a renunciar ao conflito com perdas mínimas do prestígio: é evidente que em condições actuais o Congresso não arriscará ir contra a vontade de eleitores.
 Fleet in being
 O princípio estratégico de Fleet in being – “frota em disposição”, formulado ainda no fim do século XVII e actual ainda hoje, afirma que a própria presença da frota no teatro de acções militares imobiliza o adversário, limitando sua actividade e obrigando a gastar mais forças ou a renunciar simplesmente aos seus planos. Hoje, operações da Marinha russa perto do litoral da Síria são, provavelmente, um dos exemplos patentes que confirmam esse princípio. O Fleet in being da Rússia forma-se de vários factores. Primeiro, são fornecimentos regulares de armas ao governo de Assad com a ajuda de navios militares russos. Segundo, são as potencialidades já mencionadas de radares russos e a falta da certeza dos EUA de que as informações recebidas por estes radares não sejam transmitidas em tempo real à direcção da Síria.
 De facto, o conflito sírio é um raro exemplo de uma guerra detida ainda antes de seu começo à conta de uma contraposição informativa eficaz. Destaque-se que neste conflito a Rússia utiliza métodos ocidentais tradicionais – uma campanha informativa bem-sucedida desta envergadura é uma raridade, sobretudo para a Rússia.
 A Frota continua a ser um dos instrumentos activos dessa política. É pouco provável que nalguma outra altura as informações sobre percursos marítimos e zonas de concentração da Força Naval da Rússia tenham provocado o semelhante interesse entre leitores ocidentais. O agrupamento da Marinha russa no Mediterrâneo será dirigido pelo cruzador Moskva. As naves desta classe com potentes armamentos a bordo, inclusive sistemas de mísseis contra navios P-1000 Vulkan, são intituladas pela imprensa ocidental de “assassinos de porta-aviões”. O aparecimento de tal cruzador russo em qualquer espaço operacional já é por si um argumento de peso.
 A principal mensagem de Moscovo, reforçada pelo desdobramento de um agrupamento naval na região do Mediterrâneo, consiste em que, quem quer que comece a guerra, responderá plenamente por todas as possíveis consequências. Por outro lado, os EUA são obrigados a estudar a probabilidade de começar a guerra sem apoio de aliados – uma esmagadora maioria dos países-membros da OTAN renunciou à participação na operação militar na Síria.
 Entretanto, já não se trata tanto de guerra, quanto de possível saída do estado crítico de antes da guerra com perdas de reputação mínimas. É evidente que a diplomacia russa alcançou um resultado assinalável.

Bom sinal para o futuro da Europa, a Europa integral, que é a Europa a incluir o seu maior Estado, a Rússia, talvez até uma Eurosibéria, embora esta última possibilidade se afigure, a meu ver, particularmente traiçoeira, dado que a inclusão do espaço siberiano, que é etnicamente alógeno, num espaço de Europeus, seria uma espécie de reedição da pátria multi-étnica, raiz dos maiores perigos para a Identidade e para a estabilidade política.
De um modo ou doutro, parece que, para já, o urso eslavo mostra as garras com cada vez mais eficiência, o que constitui um saudável contraponto à quase hegemonia americana.