sexta-feira, outubro 28, 2005

A TURQUIA RECENTE E ACTUAL

Este é mais um excelente artigo do Dhimmi Watch, carregado de informação sobre o que de facto se passava no Império Otomano, tão glorificado por muitos como um símbolo da tolerância islâmica. Aí, os cristãos e os judeus sofriam discriminações das mais violentas e injustas, não apenas no dealbar da Idade Moderna, mas até já no século XIX, isto é, na época contemporânea. Aí, o Islão era uma força dominante que dava forma e acção ao Turco, desde o comum homem da rua ao dirigente de relevo, chegando-se ao ponto de haver, já em 1912, um certo político supostamente «progressista» a afirmar que o Islão tinha mesmo de detestar os idólatras, incluindo os cristãos, considerando aliás que os adoradores de JC nem sequer tinham dignidade humana.

E, como seria de esperar, todas as tentativas de revolta ocorridas nas Balcãs por parte de cristãos, eram afogadas em sangue com massacres brutais.

É ainda de lembrar que o genocídio dos Arménios, entre 1915 e 1917, foi cometido pela Turquia, a qual, entretanto, se recusa a admitir tal facto (e se a Alemanha de repente adoptasse uma linha de pensamento revisionista relativamente ao holocausto, pode imaginar-se qual seria a reacção «do mundo», leia-se, da mesma escumalha político-intelectual reinante que está pronta a calar-se sobre isso para que a Turquia entre de vez na União Europeia - e tal é a tibieza desta gente, que usam frequentemente o tema do medo para convencer os Europeus a aceitar a Ásia Menor dentro da U.E.: «ou os deixamos entrar, ou então eles chateiam-se connosco e depois podem juntar-se aos islâmicos radicais...», que é o argumento do pavor e da extorsão).

Mais preocupante, é o final do artigo, em que se dá conta da tendência re-islamizante dos políticos turcos dos últimos vinte anos, em especial, claro está, o actual primeiro-ministro Tayyp Erdogan.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/ult2707u15.shtml

27/06/2005
O julgamento de Oriana Fallaci
Em 1989, Salman Rushdie publicava "Os Versos Satânicos". Foi o dilúvio, com Khomeini, líder do Irã, a condenar Rushdie à morte. Parece que o livro de Rushdie ofendia o Profeta e sua imaculada vida íntima. O aiatolá não gostou e Rushdie entrou em hibernação, com segurança 24 horas por dia. É certo que as vendas dos seus livros dispararam para a estratosfera. Mas, pergunto, será que vale a pena?

Depende, depende. Em 1989, talvez: o mundo não tolerou a intolerância dos fanáticos e, por uma vez, falou contra. Rushdie não esteve sozinho: havia, nesses tempos heróicos, uma certa coragem entre os "intelectuais" do Ocidente. A condenação a Rushdie não era apenas uma condenação a Rushdie. Era uma condenação a tutti quanti: uma ameaça a todos aqueles que pensam, escrevem e criam livremente.

Vinte anos depois, e muitas mortes depois, tudo mudou. O silêncio é a medida da nossa cobardia. Hoje, Rushdie seria morto na primeira esquina, com as patrulhas multiculturais em festa, queimando bandeiras dos Estados Unidos e criticando todos aqueles que se entregam à "blasfémia". Ah, que belo conceito: "blasfémia". Estamos nos inícios do século 21 mas as patrulhas multiculturais continuam em pleno século 14, com suas fogueiras laicas, prontas para queimar o infiel em sacrifício público. Pergunto: quem abriu o bico em defesa de Michel Houellebecq, escritor francês recentemente julgado (e absolvido) em tribunal por alegadas ofensas contra o Islão? Reparem: Houellebecq não ofendeu o sr. Silva, casado com a sra. Silva, pai do Zézé e do Martinho. Ele ofendeu o "Islão", todo o "Islão", como se este fosse pessoa singular. E quem defendeu Oriana Fallaci, uma importante jornalista italiana, julgada (e também absolvida) em tribunal pelo livro "A Raiva e o Orgulho", escrito a quente depois dos ataques de 11 de setembro? Precisamente: ninguém.

Nem ontem, nem agora: Fallaci vai regressar a tribunal com processo movido por organização muçulmana. Depois de "A Raiva e o Orgulho", Oriana Fallaci, 75, uma mulher de esquerda que cresceu em família abertamente anti-fascista, resolveu publicar novo livro, "A Força da Razão". Tese de Fallaci: a religião islâmica define-se por uma lógica de submissão e conquista e a Europa, vítima dessa lógica, será a prazo um continente islamizado, com as italianas usando véu e os homens apedrejando as suas mulheres adúlteras. E o pior é que o velho continente não responde ao ataque, diz Oriana. A Europa perdeu a sua força primordial porque esqueceu os seus valores, a sua herança, o seu secular sentido de identidade. Os muçulmanos não conseguiram conquistar a Europa nos últimos mil anos pela força das armas. Nas próximas décadas, eles vão povoar o continente pela força do sexo. Biografia é destino, sim.

Entendam: não sou fã de Fallaci e o tom é francamente desagradável. Fallaci escreve com raiva - e a raiva ofusca o pensamento. Gente que grita não tem lugar na minha estante. Além disso, Fallaci parece esquecer uma evidência: os 20 milhões de árabes que vieram para a Europa, ou a esmagadora maioria deles, procuraram fugir do exacto fanatismo que Oriana condena. Estamos no mesmo barco, cara mia. É a velha história da farinha e do saco.

Acontece, porém, que a questão não é essa. Eu não quero saber se Fallaci está certa ou errada. Eu não quero saber se o tom de Oriana é agradável ou desagradável. Eu não quero saber se a minha sensibilidade pessoal, meus gostos e desgostos, estão em sintonia com os gostos e desgostos de Oriana Fallaci. Eu quero apenas saber se Fallaci tem direito a falar. A criticar. A polemizar. E, por vezes, a ofender. Ou, inversamente, eu quero saber se um escritor (ou um artista) pode e deve ser julgado em tribunal por blasfemar. Quero saber, aliás, se "blasfémia" é crime possível nas sociedades ocidentais onde vivemos.

A pergunta se responde a ela própria: quando olhamos para a cultura ocidental, para séculos e séculos de livros e imagens que ficaram para trás, não encontramos um jardim infantil onde toda a gente vai passear as suas certezas num domingo de manhã. A cultura nem sempre é coisa bonitinha, com imagens bonitinhas e sentimentos bonitinhos, onde ninguém se ofende com ninguém. Ela é feita de golpes e contra-golpes. De críticas e provocações. De insultos. De violências. De abismos. E de blasfémias, sim, de recorrentes blasfémias contra deuses de todas as origens.

Apagar a blasfémia é, tão simplesmente, apagar as linhas anti-semitas de Céline. É apagar todo o "Paraíso Perdido" de Milton e a forma sublime como o poeta se revolta contra Deus, pela boca do diabo. É apagar os quadros de Bacon. É apagar Dante, que enfiou Maomé num dos círculos do Inferno. É apagar Voltaire. É apagar Darwin. É apagar Mencken. É apagar os filmes de Godard. As últimas tentações de Scorsese. É apagar, é apagar, é apagar, como um demente arrependido que raspa da pele as marcas do seu passado.

O julgamento de Fallaci não é um julgamento sobre as alegadas "blasfémias" da autora. É uma pergunta simples, dirigida ao coração do Ocidente: desejamos um mundo de silêncio onde o fanatismo comanda as nossas vidas? Ou preferimos um mundo livre e livremente ofensivo onde, como alguém diria, será sempre possível tentar outra vez, falhar outra vez e falhar melhor? João Pereira Coutinho, 29, é colunista do jornal português "Expresso". Reuniu seus artigos no livro "Vida Independente: 1998-2003". Escreve quinzenalmente, às segundas-feiras, para a Folha Online.

E-mail: jpcoutinho.br@jpcoutinho.com

28 de outubro de 2005 às 11:58:00 WEST  

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