sexta-feira, maio 14, 2004

MAIS UMA FUTEBOLADA

É terceiro-mundista a atitude do primeiro-ministro Durão Barroso que cancela uma visita de Estado ao México, que cancela uma ida ao Parlamento, só para ir assistir a um jogo de futebol que nem sequer envolve a selecção nacional, mas apenas um dos clubes portugueses. O futebol está cada vez mais para os Portugueses como o carnaval está para os Brasileiros - um momento fugaz de divertimento e folia, de esforço corporal e caloroso, perante um quotidiano de mediocridade e de miséria.

Durão Barroso evoca o exemplo do rei de Espanha que assistiu a uma final na Corunha, mas esquece que o equivalente português ao monarca castelhano não é o primeiro-ministro, mas sim o presidente da república.
Afirma também que se trata de uma questão de prestígio nacional... mas algum país fica prestigiado se o seu governante deixar de ir a um encontro entre chefes de Estado para ir ver a bola?

E uma parte da cambada deputadeira - os deputados - quer também ir no rol, tudo junto, porreiro, vai tudo assistir ao esférico correndo sobre a relva, em viagem paga pelo Estado.

Bem, já que a coisa é assim tão importante, seria talvez avisado colocar-se um televisorzinho - ou mesmo um bom ecrã de dimensões consideráveis - na Assembleia da República, posicionado de modo a que todos os deputados pudessem assistir ao jogo, enquanto iam ouvindo as intervenções de uns e de outros a discorrer sobre o estado da Nação, e cada deputado, com um olho no burro e outro no cigano, ia acompanhando o desenrolar dos acontecimentos, nessas duas esferas essenciais da actividade humana, a do poder temporal (político) e a do poder desportivo. Só um deputado iria ao Estádio onde se desenrolasse o evento desportivo, como presença simbólica. Assim, poupava-se dinheiro, numa época em que se procura a «contenção das despesas».

E não será de todo impossível que um dia, numa importante visita de Estado, o primeiro-ministro português seja portador de um pequeno rádio de pilha encostado ao ouvido, para lhe permitir ouvir o relato.


Trata-se pois de mais um exemplo de como a obsessão do futebol está a estupidificar o País. O futebol tudo invade e é cada vez mais colocado em pé de igualdade com a política: um divertimento alçado ao nível da governação do Estado.